Brasileiro lucra com criação de galos gigantes que custam R$ 20 mil
16/09/2023Globo Rural mostra rastros de destruição após passagem de ciclone no RS
17/09/2023 Para especialistas, sem cortar despesas, governo terá dificuldades para zerar déficit. Eles avaliam que medidas propostas para aumento da arrecadação não bastam para equilibrar contas. Analistas avaliam que é necessário cortar gastos para buscar meta de déficit zero em 2024
Getty Images
Economistas ouvidos pelo g1 avaliam que a equipe econômica do governo falhou, nos primeiros oito meses, ao não dar ao corte de gastos o mesmo peso que tem dado à elaboração de medidas de aumento de arrecadação.
Em entrevistas, os especialistas também apontaram possíveis reduções de despesas que podem ser implementadas pelo Executivo (veja as sugestões aqui).
Sem o corte de despesas, alertam os economistas, será mais difícil atingir a meta de zerar o déficit das contas públicas em 2024. Uma vez que o efeito das medidas de aumento de arrecadação propostas para alcançar esse objetivo – com impacto estimado de R$ 168 bilhões em 2024 – é considerado incerto.
Além disso, embora o arcabouço fiscal traga um espaço maior para despesas, ainda pode haver uma compressão dos chamados “gastos livres” dos ministérios, com impacto em políticas públicas. Para evitar esse cenário, também seria importante conter gastos.
Até o momento, do lado de cortes de despesas, o governo anunciou a atualização do cadastro do Bolsa Família, que pode gerar uma redução anual de despesas de até R$ 7 bilhões por ano.
E prometeu passar um “pente fino” em despesas previdenciárias. Não foram propostas alterações de leis para cortar despesas.
Tebet diz acreditar em meta de déficit zero
O que dizem analistas e o governo
Gabriel Leal de Barros, sócio e economista-chefe da Ryo Asset, disse que a agenda de correção de distorções do sistema tributário do Ministério da Fazenda, com medidas para elevar a arrecadação, parece correta.
E acrescentou: “eventual incorporação de medidas pelo lado do gasto reduziria esse desequilíbrio”.
Felipe Salto, economista-chefe da Warren Rena, avaliou que o início do ajuste pelo aumento da arrecadação é correto, pois em sua visão “não dá para atacar tantas frentes de uma vez só, sob pena de perder em todas”, mas acrescentou que é preciso avançar em medidas pelo lado do gasto em um segundo momento.
Bráulio Borges, pesquisador associado do FGV Ibre, elogiou as medidas de aumento de arrecadação do governo, mas acrescentou que elas podem não ser aprovadas, podem sofrer questionamento jurídico ou serem “desidratadas” pelo Legislativo. Por isso, para atingir as metas fiscais, avaliou que é importante que o governo também faça ajustes nas despesas.
“Se o governo quiser viabilizar o reajuste real do salário mínimo sem comprometer outras despesas, e se quiser executar aquele mínimo de investimentos públicos, sem que haja risco de contingenciamento [bloqueio de recursos], para cumprir as metas de resultado primário, é importante olhar para medidas de contenção de despesas”, disse Borges.
Armínio Fraga, ex-presidente do Banco Central, afirmou nesta semana, no Congresso, que falta um pouco de atenção, por parte do governo federal, ao gasto público.
“Falta mais ênfase no [corte de] gasto, estamos fazendo um ajuste muito voltado para a arrecadação, e esse desequilíbrio precisa ser corrigido”, declarou.
Segundo ele, as contas públicas arrumadas são uma condição fundamental para redução da taxa de juros — que não pode ser feita de maneira voluntarista.
Pelo governo federal, o secretário de Monitoramento e Avaliação de Políticas Públicas e Assuntos Econômicos do Ministério do Planejamento, Sergio Firpo, disse que a preocupação dos analistas do mercado financeiro é válida e que ela será endereçada com mais peso na medida em que tenha início o processo de revisão dos gastos públicos.
Segundo ele, a proposta da Lei de Diretrizes Orçamentárias de 2025, a ser enviada em abril do próximo ano, trará as primeiras análises de políticas públicas feitas pelo governo federal.
Procurado pelo g1, o Tesouro Nacional não respondeu, até a última atualização dessa reportagem, por que o governo se movimenta rapidamente para elevar receitas e quase não corta gastos. Também não informou se vai enviar novas propostas de mudanças legais para reduzir despesas obrigatórias.
Quais gastos podem ser revisados
1) Gastos com servidores, por meio de uma reforma administrativa
Os gastos com servidores do governo federal estão estimados em R$ 380 bilhões em 2024, ou 3,3% do Produto Interno Bruto (PIB).
É a segunda maior despesa primária do governo, perdendo apenas para a Previdência Social (R$ 913 bilhões, ou 8% do PIB).
Estudo divulgado em 2020 mostra que o Brasil gastou 13,7% do Produto Interno Bruto (PIB), no ano anterior, cerca de R$ 930 bilhões, com servidores públicos federais, estaduais a municipais. O Brasil era, naquele momento, o 7º país que mais gastava com servidores.
Análise do Banco Mundial, divulgada em 2019, apontou que os servidores federais ganhavam quase o dobro de trabalhador do setor privado. O levantamento foi feito com base em dados de 2017. Os reajustes de servidores foram contidos na gestão Bolsonaro. No início do governo Lula, foram retomados.
Em 2020, a equipe econômica chefiada por Paulo Guedes propôs uma reforma administrativa, com mudanças em leis, somente para futuros servidores, propondo o fim do regime jurídico único da União, com possibilidade de outras formas de vínculo, e o término dos chamados “penduricalhos”. A estimativa, naquele momento, era de uma economia de R$ 300 bilhões de gastos em dez anos.
O advogado-geral da União do governo Lula, Jorge Messias, avaliou nesta semana que a proposta de Bolsonaro é um “lixo”.
A atual equipe econômica, por outro lado, defendeu a regulamentação da lei que trata dos “supersalários” no serviço público e também citou mudanças nas regras de concursos públicos. Não foi feita uma estimativa de economia com essas medidas.
“O caminho para o ajuste pelo lado dos gastos passa pela adoção de processos de avaliação e revisão de gastos. Além disso, revisão de políticas de indexação e correção automática de salários e remunerações. Nisso, a reforma administrativa poderia ajudar, eventualmente”, disse o economista Felipe Salto, da Warren Rena.
2) Gastos previdenciários, por meio de uma nova reforma da Previdência
Números divulgados em abril neste ano pelo governo federal mostram que o déficit do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), sistema público que atende aos trabalhadores do setor privado, deve mais que dobrar até 2060 e quadruplicar até 2100.
A lógica é que, com o aumento da proporção de idosos no país no futuro, também cresçam as despesas com o pagamento de benefícios previdenciários — que não podem ser menores do que um salário mínimo.
Segundo o economista Paulo Tafner, as projeções para o rombo previdenciário mostram que será necessária uma nova reforma da Previdência Social nos próximos anos. A última reforma foi feita em 2019.
“Eu imagino que esse governo segura [sem fazer uma nova reforma]. No limite, se não no próximo governo, em 2026, o eleito em 2030 vai ter de fazer isso. Pois o déficit vai começar a escalar, e aí ou ele governa ou paga Previdência”, declarou Tafner, ao g1, em maio.
Nesta semana, o ex-presidente do Banco Central, Armínio Fraga, também abordou o assunto. Em audiência no Congresso Nacional, ele avaliou que os números da Previdência Social são “horrorosos” e que esse tema terá de ser “revisitado” pela sociedade no futuro.
Para ser levada adiante, essa reforma alteraria o formato de pagamento de benefícios previdenciários, que são gastos obrigatórios. Por isso, seria necessária uma nova mudança legal.
3) Reforma de gastos sociais
Estudo do economista Gabriel Leal de Barros, da Ryo Asset, aponta a necessidade de promover uma fusão de políticas sociais diante da execução fracionada de diversos programas como o Auxílio Brasil, Auxílio Gás, Auxílio reclusão, Farmácia Popular, salário maternidade, salário família, seguro defeso, BPC, dentre outros.
“A fusão de políticas sociais é algo imperativo, já que a ineficiência da gestão dessas políticas é enorme e é comum ter beneficiários recebendo dois, três, quatro e até cinco benefícios de forma cumulativa. Outras políticas como o abono salarial, de qualificação e seguro-desemprego também tem espaço para melhor eficiência”, avaliou o analista.
Segundo cálculos de Barros, a integração e redesenho dos programas sociais podem entregar economia fiscal de quase R$ 200 bilhões em dez anos.
Estudo divulgado em abril deste ano pelo Banco Mundial também sugere “consolidar” os programas em uma única transferência social escalonada, que poderia “apoiar os pobres crônicos e os afetados por choques transitórios de forma mais generosa e sustentável”.
“Vários benefícios pecuniários que deveriam ser direcionados aos trabalhadores pobres estão, na prática, beneficiando famílias com rendas mais altas. Portanto, sugere-se a introdução de uma transferência universal para cada criança, combinada com um benefício baseado em condições de renda direcionado às famílias pobres”, diz o documento.
Mudanças em leis também são necessárias para consolidar programas sociais.
4) Abono salarial
Outra política criticada por especialistas é o abono salarial, um benefício que assegura o valor de até um salário mínimo anual aos trabalhadores que receberam em média até dois salários mínimos de remuneração mensal durante pelo menos 30 dias no ano, e que estejam cadastrados no PIS ou no Pasep há pelo menos cinco anos
Estudo promovido pela equipe econômica de Paulo Guedes, que comandava a Economia na gestão Bolsonaro, conclui que, do ponto de vista distributivo, a maior parte do benefício tende a se concentrar nas camadas de renda média da população.
“Consequentemente, o Abono tem pouco efeito sobre o nível geral de desigualdade e pobreza da economia, embora contribua para uma redução da desigualdade dentro do grupo de trabalhadores formais”, diz o estudo.
A equipe de Paulo Guedes chegou a cogitar mudanças no abono salarial para destinar mais recursos ao Renda Brasil, programa de transferência de renda, mas a iniciativa foi abortada por Bolsonaro.
De acordo com análise do economista Fabio Giambiagi, o abono salarial não combate o desemprego, pois quem recebe o abono está empregado, e também não combate a miséria, porque quem recebe o abono não está entre os 20 % mais pobres do país. “Ele ajuda a reduzir a informalidade? Não, porque quem recebe o benefício já está no mercado formal”, conclui, em artigo.
O pagamento do abono salarial está estimado em R$ 28,1 bilhões para o ano de 2024. Extinto o benefício, a economia tende a superar R$ 300 bilhões em dez anos – pois o valor é corrigido anualmente. Para ser encerrado, teria de ser alterada a Constituição.
5) Revisão de contratos e programas
Enquanto não propõe mudanças em gastos permanentes, como o abono salarial, os gastos previdenciários e de servidores públicos, o governo começa a atuar com a revisão de contratos e programas. Essas revisões têm caráter administrativo.
Em janeiro deste ano, por exemplo, a área econômica anunciou a intenção de economizar R$ 25 bilhões neste ano com essas medidas. Procurado pelo g1 para saber quanto de fato já foi economizado, o Ministério do Planejamento não respondeu.
Em março deste ano, o Ministério do Desenvolvimento Social iniciou um processo de atualização do cadastro do Bolsa Família, para retirar os beneficiários não elegíveis, o que pode gerar uma redução de despesas de até R$ 7 bilhões por ano, segundo o governo.
Bráulio Borges, pesquisador associado do FGV Ibre, lembrou que um número excessivo de “famílias unipessoais” foram incluídas no Cadastro do Bolsa Família (chamado à época de Auxílio Brasil) durante as eleições do ano passado.
“Eram 2,5 milhões [de famílias unipessoais, com só uma pessoa] antes e isso saltou para seis milhões às vésperas das eleições de 2022. Governo atual já conseguiu fazer um ajuste para baixo, de cinco milhoes de benefícios, mas que ainda é o dobro do que a gente tinha antes. Estamos falando de uma potencial economia fiscal de até R$ 20 bilhões por ano”, avaliou.
Em agosto, a ministra do Planejamento e Orçamento, Simone Tebet, afirmou que a sua pasta levará adiante um “pente fino” nos gastos sociais para ajudar a fechar as contas em 2024. Na ocasião, ela lembrou que os gastos da Previdência Social somam cerca de R$ 1 trilhão por ano.
“De R$ 1 trilhão, tem entre 8% e 10% de possível erro, não fraude. Pega o crescimento médio do BPC e pega o que aconteceu nos últimos anos. Se for 1% a 2% desse valor de R$ 1 trilhão, estamos falando de até R$ 20 bilhões”, explicou a ministra, em agosto.
Por outro lado, de acordo com Marcos Mendes, pesquisador associado do Insper, gastos com benefícios previdenciários estão subestimados na proposta de orçamento de 2024. Na estimativa do especialista, seriam necessários ao menos mais R$ 16 bilhões para essa categoria.
6) Gastos em saúde e educação
Apesar de não ter proposto ainda, o governo federal informou que vai encaminhar ao Congresso projeto para mudar ao pelo menos duas despesas obrigatórias: os gastos em saúde e educação. A ideia é que essas despesas, embora tenham mais previsibilidade, sejam limitadas.
Em julho, o Tesouro avaliou que uma opção seria substituir os atuais pisos de saúde, educação e das emendas parlamentares (com base no crescimento da arrecadação) por um “indexador consistente com o mecanismo de correção da despesa global”, ou seja, que variaria de 0,6% a 2,5% em termos reais por ano.
Pela regra atual, os pisos podem crescer acima de 2,5% ao ano em termos reais.
Em 2020, a área técnica do mesmo Tesouro Nacional avaliou que haveria necessidade de mais recursos por conta do envelhecimento da população.
O setor da educação, por sua vez, reclama que, durante a gestão do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), as universidades federais sofreram sucessivos bloqueios no orçamento.
Para mudar a atual regra dos pisos de despesas em saúde e educação, teria de ser alterada a Constituição.
Fonte: G1 Read More