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02/12/2023Especialistas consultados pelo g1 apontam contradições, como rumos da produção nacional e intenção de liderar a transição energética. A possibilidade de entrada do Brasil na Organização dos Países Exportadores de Petróleo e Aliados (Opep+) contradiz alguns interesses nacionais, como os rumos da produção de petróleo nacional e a intenção de liderar a transição energética, segundo a avaliação de especialistas consultados pelo g1.
Lula: papel do Brasil na Opep+ será o de alertar os produtores de petróleo para o fim dos combustíveis fósseis
A Opep+ corteja o Brasil há alguns anos, mas, na quinta-feira (30), o governo confirmou que analisa o convite para entrar no grupo a partir de janeiro de 2024. A confirmação veio durante viagem do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) à Arábia Saudita – membro influente do grupo.
Embora os especialistas consultados pelo g1 apontem contradições, há divergências em relação a quais seriam. Há também uma possível vantagem: o acesso a informações sobre o mercado de forma antecipada.
Marina Silva diz não ver contradição na entrada do Brasil na Opep+
Leia nesta reportagem:
Como cortes de produção afetam o Brasil
Desvantagens políticas
Entrada na Opep X compromissos climáticos
Acesso a informações de mercado
Como cortes de produção afetam o Brasil
O professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Luis Eduardo Duque Dutra, destaca o objetivo do Brasil em aumentar a produção nacional para algo em torno de 5 milhões de barris de petróleo por dia até 2030. Hoje, a produção é de cerca de 3,3 milhões de barris por dia.
Isso vai de encontro aos interesses da Opep, que age para cortar a produção, aumentando o preço do petróleo no mercado internacional.
“A Opep hoje é um cartel que age como todo monopolista reduzindo a produção para aumentar o preço e esse não é um objetivo do Brasil hoje, de diminuir a produção. Então, como o Brasil vai colaborar com cortes de produção? Contraditório. Essa para mim é a maior contradição”, afirmou.
Para Duque, o grau de contradição pode ser definido pelo nível de autonomia do Brasil ao participar das decisões do grupo. “Em que medida a Opep toleraria um país que não se compromete com a política de produção da Opep?”, indagou.
A Opep foi criada em 1960 e reúne hoje 13 grandes produtores de petróleo, como Arábia Saudita, Irã e Emirados Árabes Unidos.
Junto a países aliados, como a Rússia, a organização forma a “Opep+”. Foi para integrar o grupo de aliados que o Brasil foi convidado. Ou seja, se aceitar o convite, o país não vai integrar a organização, mas participará da discussão de políticas internacionais ligadas ao setor.
Os integrantes da Opep+ fazem reuniões regulares para avaliar o cenário de oferta e demanda de petróleo no mundo, além de implementar cortes voluntários para influenciar os preços do barril.
Desvantagens políticas
Segundo o sócio e diretor do Centro Brasileiro de Infraestrutura (CBIE), Pedro Rodrigues, interessa à Opep ter como aliado um dos maiores produtores de petróleo do mundo, mas a entrada no grupo não apresenta vantagens ao Brasil.
Rodrigues cita três desvantagens para o país, caso aceite o convite, dos pontos de vista:
político, por causa da associação com países com regimes teocráticos, autocráticos ou monárquicos;
climático, por conta da transição energética e incentivo a fontes renováveis; e
do mercado interno, porque um petróleo mais caro significa mais pressão para aumentar o preço dos combustíveis, que têm impacto inflacionário.
“No Brasil, temos uma questão social com a gasolina e com o diesel muito grande. Quando sobe um centavo, dois centavos, temos essa briga para baixar o preço dos combustíveis derivados de petróleo. Imagina o Brasil ser membro de um cartel, um clube, cujo trabalho é subir o preço do barril [de petróleo]”, declarou.
Compromissos climáticos
Segundo o secretário-executivo do Observatório do Clima, Marcio Astrini, o anúncio é um “contrassenso”. Astrini destaca que, para liderar o debate climático no mundo, o Brasil precisa endereçar a exploração de petróleo.
“Tratar da questão de petróleo significa o Brasil tomar uma posição de que o petróleo precisa acabar, os combustíveis fósseis precisam acabar, e colocar em cima da mesa uma proposta de como será esse fim, como será essa transição. Esse é o debate de liderança de clima no mundo”, enfatizou.
A possibilidade de o Brasil entrar no “clube” dos países produtores de petróleo foi anunciada pouco antes da Conferência do Clima (COP) da Organização das Nações Unidas (ONU), realizada nos Emirados Árabes Unidos.
Questionada durante a conferência, a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, disse nesta sexta-feira (1º) que não vê contradição na entrada do Brasil “se for para levar o debate da economia verde, da necessidade de descarbonizar o planeta”.
Astrini afirma que a Opep, os países com grande produção de petróleo, as grandes petroleiras e companhias de carvão “sempre fizeram o máximo possível para sabotar a agenda de clima”. Segundo o secretário-executivo, a solução para a emergência climática não deve vir deles.
“Quem cava o buraco não constrói a escada para sair dele, e esse é o caso da Opep e dos países petroleiros na questão de clima”, afirmou.
O professor da UFRJ, por outro lado, não vê contradição com uma eventual entrada do Brasil no grupo. “Se existem países que podem financiar a transição energética são aqueles países que têm um fundo soberano. A Noruega é a prova disso”, afirmou.
Ele também analisa que a Opep pode ter um papel ao impedir quedas abruptas no preço do petróleo com a redução do consumo global na transição energética.
Acesso a informações de mercado
Duque Dutra, professor da UFRJ, destaca que o acesso a informações do cartel pode ajudar o Brasil a traçar estratégias em acordo ou desacordo com a Opep.
“Sem nenhuma dúvida, se existe uma vantagem de pertencer a um cartel, é exatamente a oportunidade de dividir essa informação primeiro entre os membros desse cartel. É o valor da informação que, na minha opinião, atrai ou traz vantagem em participar da Opep+”, explicou.
Pelo lado da Opep+, monitorar os passos da política energética brasileira também seria importante. “O objetivo da Opep e da Opep+ é exatamente monitorar, não é pedir para o Brasil colaborar com a redução da produção, é nos monitorar”, declarou Duque.
Fonte: G1 Read More